Impeachment de ministro do STF é competência do Senado e nunca ocorreu

O artigo 52 da Constituição Federal de 1988 dá competência privativa ao Senado Federal para processar e julgar ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) em caso de crimes de responsabilidade. No entanto, esse tipo de impeachment, que não passa pela Câmara dos Deputados, nunca aconteceu. 

Esta semana, um grupo de parlamentares voltou a criticar a atuação do ministro Alexandre de Morais no STF e no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e prometeu apresentar um novo pedido de impeachment no começo de setembro. A Lei do Impeachment (Lei 1.079, de 1950) trata do tema e, mesmo após 74 anos, continua vigente. Ela foi usada, com ajustes, nos impeachments que tiraram Fernando Collor e Dilma Rousseff da presidência da República.

O consultor legislativo João Trindade Cavalcante Filho explica que o passo a passo do impeachment de ministro do STF também está detalhado nessa lei e começa com a apresentação de uma denúncia ao Senado, que pode ser feita por qualquer cidadão ou cidadã. Em seguida, diz o consultor, a Mesa do Senado decide se aceita ou não a denúncia de que determinado ministro cometeu crime de responsabilidade. Caso seja aceito, o pedido será analisado por comissão especial a ser criada.

— Essa denúncia é feita diretamente ao Senado Federal. (…) Havendo o recebimento da denúncia, isso vai ser despachado para uma comissão que vai dar um parecer, vai fazer um estudo jurídico sobre aquela denúncia e vai então ser votado em Plenário. O Plenário do Senado vai poder abrir o processo de impeachment ou rejeitar a denúncia — disse João Trindade à Agência Senado.

O também consultor legislativo Arlindo Fernandes de Oliveira ressalta que a comissão especial só pode ser criada se a denúncia for recebida pela Mesa.

— Até onde sei, nunca uma denúncia contra ministro do STF foi recebida pela Mesa do Senado — afirmou o consultor.

O senador Eduardo Girão (Novo-CE) afirmou à Agência Senado que pretende protocolar “o maior pedido de impeachment da história”.

— Não é de hoje que a gente tem visto o Supremo Tribunal Federal com um protagonismo infeliz, invadindo competências do Legislativo e do Executivo, fazendo ativismo político judicial. Dentre 60 pedidos de impeachment que foram engavetados nas presidências sucessivas de várias legislaturas, nós temos o Alexandre de Moraes como campeão de pedidos de impeachment — disse Girão.

O senador Carlos Portinho (PL-RJ), por sua vez, avalia que o ministro Alexandre de Moraes usou instituições públicas para fins pessoais. Para ele, o ministro “jogou fora das quatro linhas”.

— Essa anormalidade democrática tem que acabar (…) o Senado não pode continuar de joelhos (…) é um escândalo — avaliou Portinho.

Nesta semana, também criticaram Alexandre de Moraes os senadores Flávio Bolsonaro (PL-RJ), Plínio Valério (PSDB-AM), Cleitinho (Republicanos-MG), Magno Malta (PL-ES), Marcio Bittar (União-AC), Damares Alves (Republicanos-DF) e Esperidião Amin (PP-SC).

Por outro lado, o senador Humberto Costa (PT-PE) argumentou que as recentes acusações contra Alexandre de Moraes são improcedentes.

— Todos os relatórios produzidos pelo TSE estão assentados nos autos do processo. Foram distribuídos a vários órgãos para embasar outras investigações em curso, tudo submetido ao crivo do Ministério Público e do contraditório. Não há nada de informal, ilegal e, muito menos, imoral — afirmou Humberto Costa.

Rito

Qualquer cidadão ou cidadã pode apresentar um pedido de impeachment ao Senado contra um ministro do STF, mas a decisão de acolher ou não um pedido desses cabe à Mesa do Senado, segundo a Constituição. Todo pedido protocolado passa, inicialmente, por análise da Advocacia do Senado, para subsidiar a decisão de acolhimento ou de arquivamento. Na prática, a decisão final é do presidente do Senado, que é quem preside a Mesa e a Comissão Diretora da Casa. 

A Mesa do Senado é responsável pela direção dos trabalhos legislativos da Casa e é composta pelo presidente, dois vice-presidentes e quatro secretários. Os mesmos senadores titulares da Mesa do Senado compõem a Comissão Diretora, cuja função é administrar internamente o Senado. 

Atualmente há 47 pedidos de impeachment contra ministros do STF aguardando despacho ou arquivamento, sendo 22 contra o ministro Alexandre de Moraes e 15 contra o ministro Luís Roberto Barroso. O pedido mais recente foi protocolado em março, contra o ministro Flávio Dino (PET 2/2024). Há pedidos para o impeachment de mais de um ministro e um que requer o impeachment dos 11 membros do Supremo ao mesmo tempo (PET 2/2021).

Depois da tramitação na Mesa, a Lei do Impeachment estabelece um passo a passo do processo e do julgamento semelhante ao de um impeachment de presidente da República, mas sem a participação da Câmara dos Deputados. 

Crime de responsabilidade

Os ministros do Supremo Tribunal Federal não podem:

  • alterar decisão ou voto já proferidos em sessão do tribunal, a não ser por meio de recurso; 
  • proferir julgamento, quando, por lei, seja suspeito na causa;
  • exercer atividade político-partidária;
  • ser flagrantemente negligente no cumprimento dos deveres do cargo;
  • proceder de modo incompatível com a honra, dignidade e decoro de suas funções.

Em todos esses casos, segundo a lei, considera-se que o ministro incorreu em crimes de responsabilidade.

O presidente do STF — ou seu substituto quando no exercício da presidência — também pode ser responsabilizado por crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária, enumerados no artigo 10 da lei de 1950.

Denúncia

O processo começa com o acolhimento inicial de uma denúncia protocolada contra ministro do STF, que pode ser apresentada por qualquer cidadão ao Senado. A denúncia tem que ser acompanhada por provas ou por indicação do local onde possam ser encontradas. A denúncia pode indicar até cinco testemunhas.

Comissão

Caso a Mesa do Senado decida acatar a denúncia, uma comissão especial de senadores é criada para opinar. Essa comissão tem 10 dias para opinar se a denúncia deve ou não prosseguir. Dentro desse período pode a comissão proceder às diligências que julgar necessárias. A lei não diz quantos senadores podem integrar essa comissão especial, mas o Regimento Interno do Senado (Risf) determina que essa comissão terá 21 senadores (um quarto da composição do Senado), “obedecida a proporcionalidade das representações partidárias ou dos blocos parlamentares”.

Defesa

O parecer segue para votação do Plenário, onde é submetido a discussão e a votação nominal e é considerado aprovado se obtiver a maioria simples de votos. Se a denúncia for considerada objeto de deliberação, a Mesa remete cópia de tudo ao denunciado, para responder à acusação no prazo de 10 dias. 

Depois disso, a comissão dá parecer, dentro de 10 dias, sobre a procedência ou improcedência da acusação e depois faz as diligências e colhe os depoimentos que julgar necessários. A comissão apresenta então seu parecer final, que é votado pelo Plenário e é aprovado se conseguir maioria simples dos votos.

Suspensão

Se a denúncia é aprovada, o ministro denunciado fica suspenso do exercício das suas funções até sentença final; fica sujeito a acusação criminal; e perde um terço dos vencimentos, que lhe será devolvido no caso de absolvição.

Em seguida, acusação e defesa apresentam seus argumentos finais e o rol de testemunhas ao Senado, que agenda a sessão de julgamento e convida o presidente do STF para presidi-la.

Tribunal

Nessa reunião, o Senado funciona como um tribunal e “serão juízes todos os senadores presentes”. O processo é lido nesta sessão e testemunhas são ouvidas. O acusador e o acusado podem inquirir as testemunhas e requerer acareações. Qualquer senador pode fazer as perguntas que julgar necessárias.

O debate entre o acusador e o acusado será pelo prazo que o presidente determinar. Depois, a sessão continua só com o presidente e os senadores no Plenário. Encerrada a discussão, o presidente submete o caso a julgamento.

Julgamento

O julgamento é feito em votação nominal pelos senadores, que respondem “sim” ou “não” à pergunta: “cometeu o acusado o crime que lhe é imputado e deve ser condenado à perda do seu cargo?”. Se a resposta afirmativa obtiver, pelo menos, dois terços dos votos dos senadores presentes, o presidente fará nova consulta ao plenário sobre o tempo durante o qual o condenado deverá ficar inabilitado para o exercício de qualquer função pública até no máximo cinco anos.

No caso de a condenação ser aprovada, fica o acusado desde logo destituído do seu cargo. Se a sentença for absolutória, produzirá a imediata reabilitação do acusado, que voltará ao exercício do cargo, com direito à parte dos vencimentos de que tenha sido privado. 

Para o arquivo

Pedidos de impeachment contra ministros do Supremo não são novidade, mas nunca foram adiante. Em 2008, por exemplo, o então presidente do Senado Garibaldi Alves Filho arquivou uma denúncia contra o então presidente do STF, ministro Gilmar Mendes. 

Em 2012, a Mesa do Senado arquivou pedidos contra José Antonio Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Em 2015, houve pedido contra Dias Toffoli. Em 2016, o então presidente do Senado Renan Calheiros rejeitou uma denúncia contra Marco Aurélio Mello e outra contra Ricardo Lewandowski. 

Em 2018, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) pediu andamento aos pedidos de impeachment contra Gilmar Mendes. O senador Jorge Kajuru (PSB-GO) discursou no Plenário no mesmo sentido. 

Em 2021, Girão apoiou pedido de impeachment contra Alexandre de Moraes com quase três milhões de assinaturas. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, rejeitou a denúncia. Em 2023, senadores pediram o impeachment de Luís Roberto Barroso.

Fonte: Agência Senado

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